28.12.05

A utilização das novas tecnologias parece agravar as desigualdades escolares e sociais

Na impossibilidade de controlo da qualidade do serviço o docente, o ME está a obrigar os professores a cumprirem um horário mais alargado nas escolas. Não são valorizadas experiências em que os professores tirem partido das novas tecnologias, que se generalizadas, alterariam profundamente o quotidiano escolar. Entre os jovens do 3º ciclo e no ensino secundário a percentagem de utilizadores da Internet já se elevava a 63% em 2002, segundo o Inquérito à utilização das tecnologias da informação e da comunicação pela população portuguesa, realizado pela Unidade de Missão Inovação e Conhecimento (http://www.posi.pcm.gov.pt/documentos/pdf/apres8.pdf). O mesmo relatório destaca que “a utilização da Internet se encontra inversamente correlacionada com a idade”. Porém, a não adesão dos docentes à Internet tem implicações diferentes das imputadas aos restantes profissionais, uma vez que a sua opção tem implicações imediatas sobre o quotidiano escolar e o futuro dos estudantes. Se a adesão dos mais jovens é tão significativa – neste momento já em muitas turmas do ensino secundário constituem excepção os alunos que não dispõem de uma ligação à Internet em sua casa - como justificar que a sua utilização não se generalize no ensino? Até quando parecerão ficção científica notícias como a que se apresenta abaixo?

"O meu professor de Matemática está aqui!" Francisco Pereira, 18 anos, está sentado em frente ao computador na sala de estar da sua casa em Linda-a-Velha. Ao fundo, na televisão passa um concurso qualquer. As badaladas do relógio de parede informam que são dez da noite. E Francisco sorri ao perceber que o seu professor acabou de ligar-se à Internet e aparecer no "messenger", um programa de conversação em tempo real que este aluno do ensino secundário e os seus colegas usam para comunicar uns com os outros. Para muitos jovens que nas últimas semanas têm vindo a preparar-se para os exames do 12º ano que amanhã começam, a Net assumiu um papel essencial. E mudou por completo o significado de estudar.
Francisco - Xico é a alcunha que utiliza na rede - ajeita o teclado do computador e começa a escrever: "Boa noite, professor." A resposta à saudação aparece quase de imediato no ecrã: "Precisas de alguma coisa?" O diálogo continua por alguns momentos. Não há dúvidas para tirar esta noite, mas se houvesse Francisco aproveitava, o que nunca aconteceria, diz, se tivesse de agarrar num telefone, por exemplo. A Internet veio facilitar tudo: "Nesta fase dos exames, então, é mesmo muito importante para mim. É uma forma de estudar sempre em grupo."
"Neste momento, uma série de amigos meus estão a estudar e têm o computador ligado na sua secretária. Se algum de nós tiver dúvidas, mandamos uma mensagem: 'Olha, vê lá aí a página tal do manual tal, o exercício x está-me a dar um valor errado'", conta Francisco. Alguém que esteja há-de responder.
Público, 22 de Junho de 2003.

Certamente que os IM’s não resolverão os problemas da Matemática, mas sem dúvida que oferecem um novo ambiente de trabalho cujas potencialidades ainda nem se conhecem em toda a sua extensão. Exige-se do aluno um novo conceito de auto-disciplina, pois sabe-se bem que a utilização da www tem uma componente lúdica que pode reduzir a sua concentração. Porém, para que a Internet seja utilizada como recurso pedagógico pelos alunos, ela terá de ser dominada pelos professores, e estes profissionais têm responsabilidades acrescidas se se problematizar a escola enquanto mecanismo reprodutor de desigualdades escolares e sociais. O contributo da escola para o agravamento das desigualdades sociais não é tema novo em Sociologia, a utilização das novas tecnologias parece agravar o problema, e no nosso país este fenómeno assume ainda maiores proporções. 84 por cento dos utilizadores de Internet em Portugal possuem um nível de instrução superior e apenas 14 por cento não completaram o 12º ano de escolaridade. Uma diferença de 70 pontos percentuais, a maior de toda a UE, que contrasta com a de 11 por cento registada na Lituânia (Eurostat, News Release 143/2005, 10/11/2005 ).

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