Estudar a educação é necessário, mas muito difícil. No recente relatório do painel norte-americano sobre o ensino da matemática (www.ed.gov/MathPanel), insiste-se repetidamente em que os estudos existentes não são conclusivos sobre um conjunto de aspectos cruciais do ensino da matemática. Afirma-se, por exemplo, que os estudos existentes não permitem defender o chamado «ensino centrado no aluno» (pág. 45). Afirma-se que não há dados conclusivos sobre as vantagens de ensinar matemática com recurso sistemático a problemas reais (pág. 49). Afirma-se, ainda, que não há dados científicos que permitam apontar vantagens no uso «da máquina de calcular no ensino elementar e recomendam-se restrições ao seu uso (pág. 50).
A modéstia e as precauções do estudo são elucidativas. E o conjunto de trabalhos de suporte, avassalador. O mais impressionante é que este painel adoptou as suas recomendações por unanimidade e reuniu durante dois anos alguns dos melhores especialistas norte-americanos. São nomes conhecidos em todo o mundo. Entre eles não se incluem apenas matemáticos e professores. Incluem-se também psicólogos e alguns dos grandes especialistas mundiais daquelas áreas que,em Portugal, se chamariam ciências da educação. Ler este relatório é um estímulo ao rigor. Percebe-se como é fácil cair em conclusões precipitadas e como muitas das ideias construtivistas defendidas por pessoas que se dizem especialistas em educação são apenas convicções românticas ou especulações infundadas. Por vezes são coisas piores, são pseudociência. E nada pior para aquelas que possam ser verdadeiras ciências da educação do que a pseudociência.
Nuno Crato
EXPRESSO, 05.04.2008
9.4.08
29.3.08
A Matemática não é Chinês - Carlos Fiolhais
Os resultados dos testes internacionais PISA, divulgados no fim de 2007, revelaram não só uma má posição de Portugal (26º lugar entre os 30 países da OCDE) como uma ausência de progressos na aprendizagem da Matemática pelos nossos jovens de 15 anos (a sua pontuação, 466, a mesma que em 2003, ficou abaixo da média da OCDE, 498). Mas o curioso é que, bem próximo de nós, embora à nossa frente, ficaram os Estados Unidos (com 474 pontos). Aqui não aconteceu nada, mas do lado de lá do Atlântico os sinos tocaram a rebate. Acaba de ser divulgado o relatório de uma Comissão Nacional, de nomeação presidencial. O relatório, que contou com a participação do Conselho Nacional de Professores de Matemática, classifica a prestação americana no ensino e aprendizagem de Matemática de "medíocre", pelo que a nossa será "medíocre menos". O estudo propõe mudanças de tomo: quer moderar o chamado ensino centrado no aluno (a investigação pedagógica não conclui pela sua superioridade) e propõe objectivos curriculares precisos em cada ano (por exemplo, as fracções devem ser dominadas entre o 5º e o 7º anos) assim como metodologias para os atingir (por exemplo, maior recurso à memória).
O relatório americano devia ser lido e reflectido. Ele diz-nos que os alunos que confiam nos seus dotes não aprendem tanto como aqueles que acreditam que o sucesso depende do seu trabalho. O "chairman" comentou: A aproximação à Matemática baseada no talento, isto é, que ou se tem jeito ou não, como para tocar violino, tem de ser mudada.
Pior do que os nossos maus resultados é a indiferença perante eles. A Sociedade Portuguesa de Matemática clamou na altura por uma mudança urgente. Mas não foi ouvida nem, muito menos, convidada para participar em qualquer processo de revisão profunda. E o mesmo aconteceu com a Associação de Professores de Matemática. O Ministério da Educação, confrontado com os dados do PISA, desvaloriza-os. Dá pena ver o esforço das autoridades nacionais para os menosprezar (chegam a ufanar-se de termos resultados semelhantes a outros países mediterrânicos, como a Itália, a Grécia e a Turquia). Quando não os menosprezam, esforçam-se por desculpabilizar um sistema que se viu a nível internacional tão cruamente retratado.
O primeiro lugar da literacia matemática foi ganho por Taiwan (549 pontos) seguido pela Finlândia, Coreia do Sul e Hong Kong. Digno de louvor é o 8º lugar conseguido por Macau (525 pontos), outrora português e hoje chinês. Um amigo meu comentou, sarcástico: Há uma boa maneira de subir no PISA. É entregarmos a administração do território... A China propriamente dita estava fora da amostra, mas os resultados não seriam muito diferentes dos de Taiwan, Hong-Kong e Macau. O que terão os jovens chineses de diferente dos norte-americanos e dos nossos?
A resposta tem a ver com a aprendizagem e com o ensino. Kevin Miller, professor de Psicologia na Universidade de Michigan, explicou, numa conferência em Coimbra, a relevância das diferenças culturais e pedagógicas, que ele próprio tem investigado. Afirmou: Nos EUA aceita-se que não perceber nada de Matemática é uma espécie de 'medalha'. O mesmo não acontece na China, onde os alunos têm interesse pela aprendizagem, pois a cultura, a escola e os professores estimulam esse interesse (...) Numa cultura como a americana os alunos tendem a esconder as suas dificuldades e, sempre que podem, fazem escolhas que contemplam níveis menos exigentes de matemática, ou de onde ela está mesmo afastada. E acrescentou: Apesar das diferenças de ensino entre os vários estados e entre escolas, há nos EUA um padrão de ensino assente na exposição do professor e na solicitação aos alunos para repetirem a informação fornecida. Em contrapartida, na China os professores além de proporcionarem uma informação sólida, procuram que os alunos expliquem os procedimentos. Assim, estimulam-nos muito mais a compreender o que vão aprendendo.
A Matemática não é chinês, podemos aprendê-la como na China.
Fonte: PÚBLICO, 28/03/2008.
Relatório Final do Departamento de Educação dos EUA
O relatório americano devia ser lido e reflectido. Ele diz-nos que os alunos que confiam nos seus dotes não aprendem tanto como aqueles que acreditam que o sucesso depende do seu trabalho. O "chairman" comentou: A aproximação à Matemática baseada no talento, isto é, que ou se tem jeito ou não, como para tocar violino, tem de ser mudada.
Pior do que os nossos maus resultados é a indiferença perante eles. A Sociedade Portuguesa de Matemática clamou na altura por uma mudança urgente. Mas não foi ouvida nem, muito menos, convidada para participar em qualquer processo de revisão profunda. E o mesmo aconteceu com a Associação de Professores de Matemática. O Ministério da Educação, confrontado com os dados do PISA, desvaloriza-os. Dá pena ver o esforço das autoridades nacionais para os menosprezar (chegam a ufanar-se de termos resultados semelhantes a outros países mediterrânicos, como a Itália, a Grécia e a Turquia). Quando não os menosprezam, esforçam-se por desculpabilizar um sistema que se viu a nível internacional tão cruamente retratado.
O primeiro lugar da literacia matemática foi ganho por Taiwan (549 pontos) seguido pela Finlândia, Coreia do Sul e Hong Kong. Digno de louvor é o 8º lugar conseguido por Macau (525 pontos), outrora português e hoje chinês. Um amigo meu comentou, sarcástico: Há uma boa maneira de subir no PISA. É entregarmos a administração do território... A China propriamente dita estava fora da amostra, mas os resultados não seriam muito diferentes dos de Taiwan, Hong-Kong e Macau. O que terão os jovens chineses de diferente dos norte-americanos e dos nossos?
A resposta tem a ver com a aprendizagem e com o ensino. Kevin Miller, professor de Psicologia na Universidade de Michigan, explicou, numa conferência em Coimbra, a relevância das diferenças culturais e pedagógicas, que ele próprio tem investigado. Afirmou: Nos EUA aceita-se que não perceber nada de Matemática é uma espécie de 'medalha'. O mesmo não acontece na China, onde os alunos têm interesse pela aprendizagem, pois a cultura, a escola e os professores estimulam esse interesse (...) Numa cultura como a americana os alunos tendem a esconder as suas dificuldades e, sempre que podem, fazem escolhas que contemplam níveis menos exigentes de matemática, ou de onde ela está mesmo afastada. E acrescentou: Apesar das diferenças de ensino entre os vários estados e entre escolas, há nos EUA um padrão de ensino assente na exposição do professor e na solicitação aos alunos para repetirem a informação fornecida. Em contrapartida, na China os professores além de proporcionarem uma informação sólida, procuram que os alunos expliquem os procedimentos. Assim, estimulam-nos muito mais a compreender o que vão aprendendo.
A Matemática não é chinês, podemos aprendê-la como na China.
Fonte: PÚBLICO, 28/03/2008.
Relatório Final do Departamento de Educação dos EUA
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